Gente Burra!
Pois é,
- As condições que o senhor relata ainda permanecem? Pergunta o juiz, olhando para o autor da representação.
- Não, Meritíssimo. De fato, os animais não estão mais lá, embora toda a estrutura utilizada, casinha, pratos de comida e brinquedos ainda continuem. O que me faz pensar que poderão trazer novos animais.
- O que vocês fizeram com os animais? Pergunta o juiz, desta vez olhando para os autores dos fatos.
- Eles ficaram muito grandes e a gente levou para um sítio depois que eles participaram da exposição. Inclusive um deles ganhou um prêmio.
- E vocês pretendem levar novos animais para o local?
- Não, doutor.
- Nessas condições o senhor concorda em encerrar o caso por aqui? O juiz ao autor.
- Meritíssimo, não posso transigir com a dor dos animais. Essa gente dava choque e aplicava injeções para que eles parassem de latir, conforme o senhor pode verificar nos autos do inquérito.
- Doutor? Diz o juiz virando-se para o promotor de justiça.
- Nesse caso vamos fazer uma transação, inicia este, dirigindo-se aos autores do fato. O senhor tem renda? Moram juntos?
- Não, sou estudante e moro na casa do meu pai. Nós somos apenas namorados.
- E a senhora?
- Eu sou professora e ganho mil e quinhentos reais.
- Os fatos aqui relatados são graves. Vamos fazer o seguinte, prossegue o promotor de justiça: para o senhor eu estabeleço o pagamento de trezentos reais e para a senhora duzentos reais. Concordam?
- Não se esqueçam que vocês têm trinta dias para pagar. Aceitam? Pergunta o juiz.
Nisso o advogado que acompanhava os autores dos fatos entra na conversa recusando a transação.
- Com esses valores fica difícil de aceitar. Veja, os animais eram bem tratados, até dormiam no sofá...
- Doutor, agora é hora da transação e não de dar explicações. Não aceita, então!?
Vira-se para a secretária:
- Proposta a conciliação, esta restou inexitosa. O promotor de justiça ofereceu transação nas seguintes condições ... que não foi aceita. O autor da representação juntou rol de testemunhas. Designo dia ... para a audiência de instrução.
Chico Buarque fala em "Gente Humilde", eu falo em "Gente Burra".
Burrice desses dois. Diversas pessoas, dentre elas eu, viram, por várias vezes, eles dando choques e aplicando injeções em três enormes cachorros, parece que da raça dog alemão (?), além de mantê-los em um espaço de não mais que dois por dois, nas piores condições de higiene e muitas vezes sem comida. Tudo com o fim de educar os animais para competições.
Cansado de tanta crueldade fui na polícia e "dei parte". Aconteceu algo raro: dificilmente as pessoas se dispõem a ir numa delegacia sabendo que isso pode ser "briga de vizinhos". A situação era tal, no entanto, que DEZ vizinhos, por livre e espontânea vontade, ao saberem que eu havia iniciado o inquérito, foram até a Delegacia prestar depoimento e contar o que haviam visto.
Isso, por si só, deveria fazer com que qualquer um, com um QI maior do que 10, desistisse de tentar provar que eu e os outros estávamos inventando tudo. Mas não, eles resolveram ir "pro pau". Pois vão levar pau. A pena prevista para o crime de maus-tratos a animais é de três meses a um ano de detenção E multa (art. 32 da Lei 9.605/98 - Lei dos Crimes Ambientais).
Por um segundo cheguei a pensar na possibilidade de sentir pena dos infelizes e pedir ao promotor de justiça que alterasse a proposta de transação. Mas o que poderia ser oferecido em troca do sofrimento dos animais? Talvez pedir que eles se submetessem a uma sessão de choques? Três para cada um? Interditar o banheiro da casa deles por uma semana e deixá-los ali, sem poder sair, convivendo com o resultado expelido pelos seus cérebros?
Me pergunto que tipo de cidadãos uma professora dessas deve estar formando.