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sexta-feira, abril 22, 2005

I. Feira da Fruição

Pois é,

Não sei se faço bem em expandir um assunto, uma idéia que não é minha. Posso até estar atrapalhando sua gestação. Se esse for o caso, que me perdoe o Gejfin pela intromissão indevida. Caso contrário, receba estes últimos posts como um singela colaboração, com a garantia de que sempre assumirei que a idéia não foi minha e sim dele. (a bem da verdade, não sei o quanto o Tiagón está envolvido no nascimento da idéia. Sei que a Aninha debate o tema com o Gejfin. Por uma questão de economia, citarei apenas o Gejfin como autor. Sintam-se, no entanto, todos citados).

A Luma gentilmente nos aponta um texto do Rubem Alves, "Rubem Alves entrevista Marx numa Cervejaria", onde se lê:


"E em qual escola se gasta tempo na educação dos sentidos? Bobagem. Isso é coisa da " Feira da Fruição" - não circula no sistema. O que importa é a " Feira das Utilidades" - seus saberes úteis, transformáveis em mercadoria, passíveis de circular no mercado de trabalho. Por que gastar tempo no desenvolvimento das inúteis potencialidades do ser, na educação dos sentidos para os prazeres inúteis, insignificante do ponto de vista econômico, se os corpos podem ser transformados em unidades de produção. O que é um profissional? É um corpo, outrora portador de sentidos, que se transformou em ferramenta, utilidade. ' Quanto menos você for, mais você terá...'".

E,


"Esse jogo perverso nos tornou ' tão estúpidos e parciais que somente consideramos nosso um objeto quando o possuimos, quando ele é utilizado de alguma forma. Assim, todos os sentidos físicos e espirituais são substituidos pela simples alienação de todos esses sentidos, ou seja, pelo sentido da posse(...) Quanto menos você comer, beber, comprar livros, for ao teatro, aos bailes, às boates, quanto menos você pensar, amar, teorizar, cantar, pintar, tanto mais você será capaz de economizar e tanto maior será o seu tesouro. Quanto menos você for, tanto mais você terá...'"
É bom ler o texto todo, pois qualquer recorte sempre será subjetivo e poderá servir apenas aos interesses de quem recortou.

Alheio a todos os debates que estão rolando sobre o papa, o grafite, racismo, cotas, vou me dedicar a construir uma trilogia: o sólido, o líquido e o gasoso. Confesso que desde dezembro, quando o Gejfin, primeiro lá na especialização, depois no blog, desejou a todos que 2005 fosse um ano líquido, fiquei com esse negócio na cabeça. De lá pra cá ainda não havia encontrado um mote para tentar desenvolver o assunto e, mesmo, referências que pudessem levar às minhas idéias algo mais que serem somente minhas idéias. Até porque, minhas idéias poderiam ser fruto de alguma noite em que estivesse alcoolizado mais do que o normal. E, nesses casos, é sempre bom rasgar tudo depois.

Foi aí que, tentando ler pela nonagésima vez o sermão da Sexagéssima, do Padre Antonio Vieira (por quê? Ora, porque é famoso e é uma aula de argumentação, de retórica) e tendo desistido pela nonagésima vez (verdade seja dita, apesar de ser uma aula é um saco, mas um dia eu consigo terminar), resolvi folhear o restante do livro (vol I da coleção) e encontro o texto que utilizei no post anterior. Pronto. Aí estava o ponto de partida para tentar construir um pensamento que, no mínimo, pudesse receber esse nome.

Surge aí um outro problema: como começar e desenvolver o tema. Iniciar pelo líquido e exaltá-lo pela posterior contraposição ao sólido e ao gasoso? Iniciar com o sólido e com o gasoso para, então, por exclusão ou indução chegar ao líquido? Será que existe essa oposição ou, como defendeu o Gejfin num comentário ao post anterior, a questão é de evolução e não de oposição?

Incialmente penso que cabe um pequeno esclarecimento, em resposta a alguma provável pergunta do tipo "mas e pra que que serve essa droga toda?" Pois demorei a tratar do assunto exatamente tentando encontrar uma resposta para essa pergunta. E concordo, não é possível sequer pensar nisso sem que se tenha respondido/entendido antes o porquê de se pensar nisso num mundo tão conturbado de papas, grafites, severinos, cotas, etc. Afinal, soa como alienação.

Qual o conceito subjacente às palavras sólido, líquido e gasoso que pode ser utilizado para tentar associá-los a um sentido de evolução do homem?

É o que se segue.

Comentário aos comentários (sugiro a leitura destes antes).

Edu, pensa não num círculo, mas numa espiral tridimensional. Círculos são representações de sólidos (esferas) no plano. Claro que passamos diversas vezes, ao longo da vida, por pontos antes passados, mas numa espiral há sempre a terceira dimensão que os torna diferentes dos anteriores. É bem matemático mesmo: cada ponto de uma espiral tem dois referenciais, eixos x e y, iguais ao anterior; mas tem, também, um referencial no eixo z que é diferente, e é esse referencial que nos leva a evoluir, que leva a espiral a crescer no espaço e no tempo. E leva a que eu vá utilizar, já adiantando um pouco, a figura da espiral como representação do fluir, essência que é do ser líquido. Nossa vida deve ser uma espiral e não um círculo.